03 de maio de 2022

Parecer do SDPA ao Projeto de Decreto Legislativo Regional n.º 52/XII

PARECER DO SDPA SOBRE O PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO REGIONAL N.º 52/XII – “NONA ALTERAÇÃO AO DECRETO LEGISLATIVO REGIONAL N.º 21/2007/A, DE 30 DE AGOSTO – ESTATUTO DO PESSOAL DOCENTE DA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR E DOS ENSINOS BÁSICO E SECUNDÁRIO NA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES”

 

No âmbito da apreciação pública das associações sindicais, no processo de elaboração da legislação do trabalho, remete o SDPA, no dia 2 de maio de 2022, à Comissão Permanente de Assuntos Sociais da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA), o competente Parecer ao Projeto de Decreto Legislativo Regional n.º 52/XII – “Nona alteração ao Decreto Legislativo Regional n.º 21/2007/A, de 30 de agosto – Estatuto do Pessoal Docente da Educação Pré-Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário na Região Autónoma dos Açores”, respeitante aos contratos de trabalho a termo resolutivo dos docentes e do respetivo direito à compensação por caducidade.

É sempre de louvar qualquer alteração legislativa, levada a cabo pelo Parlamento Regional no âmbito da sua competência legislativa, que vise clarificar erradas interpretações da administração pública regional, com claro prejuízo para os cidadãos em geral, e para os docentes em particular, como é o caso da norma contida na parte final do nº 2, do artigo 50º do Decreto Legislativo Regional nº. 21/2007/A, de 30 de agosto.

Todavia, mais importante do que qualquer putativa alteração de clarificação interpretativa, o Parlamento Regional tem, no âmbito das suas competências, legislativa e de fiscalização da ação do Governo Regional, a obrigação de promover alterações aos diplomas regionais com vista a expurgá-los de normas inconstitucionais, e, em consequência, instar o Governo Regional a cumprir a lei, no caso concreto, a proceder ao pagamento imediato das compensações por caducidade, desaplicando a norma inconstitucional.

A norma do Estatuto cuja alteração ora se propõe, aprovada pelo anterior Governo, é manifestamente inconstitucional. Organicamente inconstitucional.

Atente-se:

A L.G.T.F.P. expressamente qualifica, na al. k), do nº 3, as normas relativas à extinção do vínculo, como “normas base definidas do regime e âmbito do vínculo de emprego público”.

         Assim:

Artigo 3.º - Bases do regime e âmbito

Constituem normas base definidoras do regime e âmbito do vínculo de emprego público:

(…)

k) Os artigos 288º a 313º, relativos à extinção do vínculo.

(…)

Dispõe o artigo 293º, integrado no Capítulo IX, Extinção do Vínculo – artigos 288º a 313º - o seguinte:

Artigo 293º - Caducidade do contrato de trabalho em funções públicas a termo certo

1 - (…)

2 - (…)

3 - Exceto quando decorra da vontade do trabalhador, a caducidade do contrato a termo certo confere ao trabalhador o direito a uma compensação, calculada nos termos previstos no Código do Trabalho para os contratos a termo certo.

A solução presente na norma em apreço constitui um desvio – único a nível nacional – ao disposto no artigo 293º da L.G.T.F.P., que regulamenta tal matéria a nível nacional, integrado no regime normativo relativo à extinção do vínculo, entendida como matéria respeitante às bases do regime do vínculo público.

A propósito do que se deve entender por normas base definidoras do regime e âmbito do vínculo do emprego público, escreveu-se no douto Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 502/2019, de 26 de setembro, o seguinte:

“Já no Acórdão n.º 302/2009 (em entendimento que viria a ser reiterado no Acórdão n.º 76/2013) considerou-se:

«Por outro lado, a Constituição reserva, também à Assembleia da República, nos termos constantes do seu artigo 165º, n. 1, alínea t), competência para legislar sobre as “bases do regime e âmbito da função pública”.

Relativamente a esta matéria, a  Comissão Constitucional, ainda na vigência do primitivo texto constitucional, logo evidenciou que a referida norma apenas se dirigia ao “estatuto geral” da função pública, abraçando o que “é comum e geral a todos os funcionários e agentes”, tal como “a definição do sistema de categorias, de organização de carreiras, de condições de acesso e de recrutamento, de complexo de direitos e deveres funcionais que valem, em princípio, para todo e qualquer funcionário público e que, por isso mesmo, favorecem o enquadramento da função pública como um todo, dentro das funções do Estado”, cabendo, por seu turno, na competência legislativa do Governo a “concretização” desse estatuto geral, a sua “complementação, execução e particularização” (cf. pareceres nºs 22/79 e 12/82, Pareceres da Comissão Constitucional, vols. 9º, p. 48, e 19º, p. 119, respectivamente), tendo  este Tribunal mantido idêntica posição em arestos posteriores (cf. Acórdão n.º 142/85, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 6º vol.)»

E o Acórdão n.º 828/2017, referindo-se também ao «estatuto geral» dos trabalhadores da Administração Pública, afirma:

«12. (…) É que o “estatuto geral” dos trabalhadores da Administração Pública, abrangendo o que é comum a todos eles, nomeadamente, a definição do sistema de vínculos, carreiras e categorias, as condições de acesso e de recrutamento, e o complexo de direitos e deveres funcionais, é matéria de reserva relativa da Assembleia da República, cabendo ao Governo, estabelecer os respetivos desenvolvimentos através de decretos-lei de desenvolvimento (alínea t), nº 1, do artigo 165.º e alínea c), n.º 1, do artigo 198.º, da CRP). Por outro lado, os trabalhadores da Administração Pública, no exercício das suas funções estão exclusivamente ao serviço do interesse público (n.º 1 do artigo 269.º e 271.º da CRP). Ainda que se admita que da Constituição não decorre um modelo de vínculo laboral puramente estatuário, o certo é que a Administração Pública está, na sua autonomia pública e privada, sujeita a parâmetros de juridicidade que não vinculam, na mesma medida, a generalidade dos cidadãos, na específica margem de liberdade decorrente da sua autonomia privada.»

Mais recentemente, teve o Acórdão n.º 77/2018 oportunidade para revisitar a jurisprudência constitucional sobre o conceito de bases do regime jurídico da função pública, que assim sintetizou:

«30. Ora, sobre este ponto, é elucidativa a jurisprudência deste Tribunal sobre o âmbito de proteção garantido pela alínea t) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP em matéria de bases do regime jurídico da função pública, no sentido de que a mesma está circunscrita à regulação dos princípios fundamentais do regime, bem como à delimitação do seu âmbito institucional e pessoal.

Para este efeito, é de recuperar o já decidido no Acórdão n.º 468/2010, de 25 de novembro:

«(…)»

Também dos Acórdãos n.º 142/85, 695/2005, 184/08, 491/2008, 528/2008, 74/2009 e 302/2009 se retira do mesmo entendimento, sendo que, mais recentemente, tal interpretação vem perfilhada no Acórdão n.º 793/13, de 21 de novembro (todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).» “

Tal tese foi sufragada pelo Tribunal Constitucional, por Acórdão nº. 503/2021, de 09/07/2021, proferido pela 3ª. Secção, no âmbito do Processo nº 136/20, extraída dos autos de Processo nº 168/18.0BEPDL do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada, aquando da apreciação da inconstitucionalidade da norma extraída do artigo 47º, do Decreto Legislativo Regional nº 1/2018/A (Lei do Orçamento), que também dispunha sobre compensação por caducidade, decisão do conhecimento do Governo Regional, através da Secretaria da Educação.

Por ser assim, entendemos que, concomitantemente com a alteração agora proposta, que deveria expor nos seus motivos também a necessidade de expurgar do diploma norma inconstitucional, deveriam os grupos parlamentares proponentes apresentar também, à Assembleia Legislativa Regional, uma proposta de Resolução ou de Recomendação ao Governo Regional para, face a inconstitucionalidade orgânica de que a norma padece, proceder ao pagamento imediato da compensação por caducidade dos contratos dos docentes, referentes ao ano escolar 2020/2021, pois só assim se fará a propalada justiça.

A assim não ocorrer, estão os grupos parlamentares e a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores a sufragar a injustiça cometida pelo Governo, e a permitir a aplicação de normas inconstitucionais, demitindo-se do seu papel fiscalizador.

 

Sindicato Democrático dos Professores dos Açores, Ponta Delgada, aos 02 de maio de 2022.

 

Comunicado de imprensa - 03/05/2022
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